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confira a resenha A Disciplina do amor de Lygia Fagundes Teles

Atualizado: 10 de jun. de 2022


UMA OBRA PRIMA QUE MERECE SER LIDA







A disciplina do amor, Fragmentos, foi publicada em sua primeira edição no ano de 1980 pela escritora Lygia Fagundes Telles ( nasceu em 19.04.1923 e faleceu em 03.04.2022), com seu jeito aparentemente calmo, demonstrava amar muito o que fazia e talvez não tenha sido por acaso, publicar essa obra cujo tema central trata das peculiaridades que cada pessoa ou mesmo os bichos têm para demonstrar sua forma de amar, os aspectos íntimos dos relacionamentos humanos, suas contradições, sua intensidade, seus dramas e seus fervores. Mas nos brinda, também, deixando transparecer sua opinião político-social muito bem formada, tendendo para um lado, mas sem engajamentos frívolos, indo da política ideológica, da crítica social e econômica ao movimento feminista.

Toda obra é dividida em parte como o subtítulo fragmentos sugere e não segue uma linha cronológica rigorosa, às vezes, surge na contemporaneidade, ora regride aos tempos de sua infância e passeia em sua adolescência, dando a impressão de tratar-se de uma obra autobiográfica entremeada com crônicas e relatos ficcionais. Trata-se de uma obra inspiradora. Várias passagens da vida da autora foram relatadas como viagens internacionais descrevendo usos e costumes de outras culturas, além de suas reflexões sobre os relacionamentos humanos, tão conturbados. O tema é sempre atual pois as relações de amor e ódio da humanidade sempre provocam inspirações de toda ordem e a autora soube ir aos pormenores desses conflitos que envolviam não só relação de humano para humano, mas também de humano para seus bichos de estimação.

Apesar de toda genialidade da autora, reconhecida pelos principais concursos literários que ganhou, a história apresenta em alguns momentos uma certa complexidade pois se trata de relacionamentos reais e outros imaginários. Há fragmentos muito sutis que carecem de maior análise para ser mais bem interpretados. Entretanto, a forma narrativa é apaixonante para quem gosta de escrever, é um estilo dinâmico, embora sucinto, cheio de detalhes e descrições belíssimas, intimista.

A obra A disciplina do amor é muito brilhante e não pretendo me limitar a fazer uma resenha crítica e sim uma síntese da obra como é de costume do blog, dar o prazer ao leitor de conhecer um pouco das grandes obras produzidas por escritores imortais. Assim, destaquei algumas partes da obra e reproduzi enxertos desses contos para compartilhar a mesma emoção que tive em ler e certamente, motivar o leitor a ler a obra por completo.



O gato

“Tudo passa sobre a terra! _ estava escrito no final do romance que achei triste. Olhei para a outra Iracema que dormia no meio do tapete. Também você vai passar? Tu quoque, Iracema?! Não sabia ainda que permaneceria infinita na minha finitude.

17 de janeiro

Me alinhei ao lado dos humildes e descobri que não era bastante humilde para ficar junto deles, falsa a minha curvatura, falso o despojamento. Me alinhei ao lado dos fortes e vi que não era suficientemente forte para sustentar por mais tempo aquela arrogância, representava planar sobre os outros porque acreditei que assim não seria esmagada pelo rolo compressor. Teria que subir acima desse rolo, pisar nele _ ah, meu Deus, mas era isso o que eu queria?

O sonho

Vejo então um homem de sobretudo preto e chapéu desabado caminhando firme na minha frente. Tem as mãos metidas nos bolsos e anda com segurança, sem olhar para os lados na sua marcha decidida em direção à floresta. Me animo, tenho companhia, vou com ele! resolvi e eis que um homem semelhante apareceu com seu sobretudo e chapéu, andando alguns passos atrás do primeiro. Um é o Bem e o outro é o Mal – alguém me avisou ou descobri de repente. Parei sem saber qual escolher, nenhuma diferença, tão iguais!

29 de outubro

Volto de uma reunião feminista. Exaltação e fervor na maioria dos participantes. De resto, a mesma confusão de toda revolução ainda no início. Discussões bizantinas em torno de palitos quando o essencial!...Muita vontade de afirmação pessoal, muita vontade de poder na mesma linha machista. Digressões e agressões desnecessárias. Algumas das revolucionárias sabem. Mas são poucas as que sabem e desenvolvem um raciocínio claro.

A prova

“Você será uma plantinha anêmica, feia, não acredito na sua sobrevivência, está me ouvindo? Não gosto de você!” Ela ouviu. As outras também ouviram e sentiram a diferença de tratamento: a semente bem-amada resultou numa planta vigorosa e cheia de graça. A semente regada com indiferença cresceu indiferente, sem a exuberância da primeira. Quanto à semente rejeitada, esta virou uma plantinha obscura, de caule entortado e folhas tímidas, a cabeça pendida para o chão.

A Disciplina do Amor

Foi na França, durante a segunda grande guerra: um jovem tinha um cachorro que todos os dias, pontualmente, ia esperá-lo voltar do trabalho. Postava-se na esquina, um pouco antes das seis da tarde. Assim que via o dono, ia correndo ao seu encontro e na maior alegria, acompanhava-o com seu passinho saltitante de volta à casa. A vila inteira já conhecia o cachorro e as pessoas que passavam faziam-lhe festinhas e ele correspondia, chegava a correr todo animado atrás dos mais íntimos. Para logo voltar atento ao seu posto e ali ficar sentado até o momento em que seu dono apontava lá longe. Mas eu avisei que o tempo era de guerra, o jovem foi convocado. Pensa que o cachorro deixou de esperá-lo? Continuou a ir diariamente até a esquina, fixo a olhar ansioso naquele único ponto, a orelha em pé, atenta ao menor ruído que pudesse indicar a presença do dono bem-amado.

Falar de amor sempre será atual não importando de quem ou de como se falou. A narrativa é simplesmente maravilhosa, empolgante e deixa sempre o gosto de querer ler sem parar tendo como pontos positivos as descrições, os fatos históricos e as reflexões bem pertinentes ao mundo em que ela viveu, como retomar fatos importantes da história do mundo atual, também do Brasil; reflexões sobre os relacionamentos entre homem e mulher e do mesmo sexo e da crítica social, econômica e política.



Obra: A Disciplina do Amor

Autor: Lygia Fagundes Telles

Edição: 6ª

Ano:1980

Editora: Editora Nova Fronteira

Número de páginas:151

Formato: 14x21

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